Não poucas pessoas desejariam adiar o Batismo para a idade madura dos candidatos, visto que muitos dos que são batizados em idade infantil, não assumem as obrigações decorrentes do sacramento.
Em vista dos debates assim oriundos, a Congregação para a Doutrina da Fé publicou, em nome do Santo Padre João Paulo II, em 20 de outubro de 1980, uma Instrução sobre o Batismo das Crianças, na qual analisa a problemática. Vejamos, a seguir, o conteúdo desse documento.
A Sagrada Escritura não se refere explicitamente ao Batismo de crianças. Todavia narra que vários personagens pagãos professaram a fé cristã e se ficeram batizar "com toda a sua casa". Assim o centurião romano Cornélio (At 10,1s.24.44.47s), a negociante Lídia de Filipos (At 16,14s), o carcereiro de Filipos (At 16,31-33), Crispo de Corinto (At 18,8), a família de Estéfanas (1Cor 1,16).
A expressão "casa" (domus, em latim; oikos, em grego) tinha sentido amplo e enfático na Antigüidade: designava o chefe de família com todos os seus domésticos, inclusive as crianças (que geralmente não faltavam). Inderetamente, pois, as Escrituras sugerem o Batismo das crianças.
Renascer da Água e do Espírito
Esta impressão se confirma desde que consideremos que os judeus batizavam os filhos pequeninos dos pagãos que abraçassem a fé de Israel. Ademais, Orígenes de Alexandria (+ 250) e Santo Agostinho (+ 430) atestam que "o costume de batizar crianças é tradição recebida dos apóstolos". No próprio Evangelho, aliás, lê-se a palavra incisiva do Senhor: "Quem não renascer da água e do Espírito, não poderá entrar no Reino dos Céus" (Jo 3,5).
Esses dizeres sempre foram entendidos em sentido estrito e aplicado tanto a crianças quanto a adultos. Quando, no século II, aparecem os primeiros testemunhos diretos do Batismo de crianças, nenhum deles o apresenta como inovação.
Santo Ireneu de Lião (+ 202) considera óbvia, entre os batizados, a presença de "crianças e pequeninos" ao lado dos jovens e adultos (Contra as Heresias II,24,4). Sob São Cipriano de Cartago (+ 258), um sínodo do Norte da África dispôs que se podiam batizar as crianças "já a partir do segundo ou terceiro dia após o nascimento" (Epístola 64 de São Cipriano).
Fazendo eco à Sagrada Escritura e à Tradição, os Papas e Concílios intervieram, muitas vezes, para recordar aos cristãos o devem de mandarem batizar os seus filhos pequeninos. Assim o Concílio de Cartago, em 418:
"Também os mais pequeninos, que não tenham ainda podido cometer pessoalmente algum pecado, são verdadeiramente batizados para a remissão dos pecados, a fim de que, mediante a regeneração, seja purificado aquilo que eles têm de nascença" (Dz.-Sch., Enquirídio, nº 223).
Essa doutrina foi reafirmada por toda a Idade Média. Em 1547, o Concílio de Trento rejeitou a posição dos anabatistas, segundo a qual "era melhor omitir o Batismo das crianças do que as batizar só na fé da Igreja, uma vez que elas ainda não crêem com um ato de fé pessoal" (Op.cit., nº 1626).
O Batismo e o Novo Catecismo
Ainda recentemente, o Catecismo da Igreja Católica ensina: "Por nascerem com uma natureza humana decaída e manchada pelo pecado original, também as crianças precisam do novo nascimento no Batismo, a fim de serem libertadas do poder das trevas e serem transferidas para o gozo da liberdade dos filhos de Deus, para a qual todos os homens são chamados.
A gratuidade pura da graça da salvação é particularmente manifesta no Batismo das crianças. A Igreja e os pais privariam então a criança da graça inestimável de tornar-se filho de Deus, se não lhe conferissem o Batismo pouco depois do nascimento. Os pais cristãos hão de reconhecer que esta prática corresponde também à sua função de alimentar a vida que Deus confiou a eles" (nº 1250).
A razão teológica pela qual a Igreja pratica o Batismo de crianças é a seguinte: o sacramento não é mera matrícula numa associação, mas é um renascer, um receber a vida nova dos filhos de Deus, que tem pleno sentido mesmo que a criança ignore o que lhe acontece; esse renascer para a vida eterna é que dá pleno sentido ao primeiro nascimento (a partir dos pais), pois torna a criança herdeira do Sumo Bem.
O fato de que as crianças ainda não podem professar a fé pessoalmente não é obstáculo, pois a Igreja batiza os pequeninos na fé da própria Igreja, isto é, professando a fé em nome dos pequeninos. Esta doutrina se acha expressa no Ritual do Batismo, quando o celebrante pede aos pais e padrinhos que professem "a fé da Igreja, na qual as crianças são batizadas" (nº 256).
Santo Agostinho dilata o horizonte do cristão ao escrever: "As crianças são apresentadas para receber a graça espiritual, não tanto por aqueles que as levam nos braços (embora também por eles, se são bons fiéis), mas sobretudo pela sociedade universal dos Santos e dos fiéis... É a Mãe Igreja toda, que está presente nos seus Santos, a agir, pois é ela inteira que os gera a todos e a cada um" (Epístola 98,5).
A Igreja só não batiza as crianças, quando os pais não o querem ou quando não há garantia alguma de que o batizado será educado na fé católica. Mesmo quando os genitores não vivem como bons católicos, a Igreja julga que a criança tem o direito de ser batizada, desde que os próprios pais ou os padrinhos ou a comunidade paroquial se encarreguem de ministrar-lhe a instrução religiosa.
A Carta Apostólica "Familiaris Consortio", do Santo Padre João Paulo II, pede aos pais católicos que não vivem o matrimônio sacramental, que "eduquem os filhos na fé cristã" (nº 8) - o que implica o dever de mandar batizar os filhos e providenciar a educação religiosa dos mesmos.
Como objeção a essa doutrina, levanta-se a seguinte ponderação: o Batismo das crianças constitui um atentado à liberdade das mesmas; impõe-lhes obrigações religiosas que talvez não queiram aceitar em idade juvenil. Daí a conveniência de só se ministrar o Batismo a quem possa assumir livremente os respectivos compromissos. Respondemos:
É de notar que, no plano natural, os pais fazem, em lugar de seus filhos, opções indispensáveis ao futuro destes: assim o regime de alimentação, a higiene, a educação, a escola... Os pais que se omitissem a tal propósito sob o pretexto de salvaguardar a liberdade da criança, prejudicariam seriamente a prole.
Ora, a regeneração batismal vem a ser o bem por excelência que os pais católicos devem proporcionar aos filhos, juntamente com a alimentação e a educação; para quem tem fé, a filiação divina é o mais importante de todos os valores;
Mesmo que a criança, chegando à adolescência, rejeite os deveres decorrentes do seu Batismo, o mal é então menor do que a omissão do sacramento. Com efeito, o fato de alguém rejeitar a boa educação que recebeu, é dano menos grave do que a omissão de educação por parte dos pais. Observemos ainda que, não obstante as aparências, os gérmens da fé depositados na alma da criança poderão um dia reviver; os pais contribuirão para isso mediante a sua oração e o seu autêntico testemunho de fé.
Caso não seja possível batizar, a Igreja confia a criança falecida ao amor de Deus, que é Pai e fonte de misericórdia. A partir de Santo Anselmo (+ 1109), os teólogos propuseram o Limbo como estado de felicidade natural reservada a tais crianças; elas veriam Deus não face a face, como no céu, mas indiretamente, através do espelho das criaturas.
A doutrina do Limbo não constitui artigo de fé, de modo que se pode crer que Deus tem recursos invisíveis para salvar todas as crianças, mesmo as que morrem sem Batismo; a Igreja ora diariamente por todos os necessitados, e também por tais crianças.
Essa observação, porém, não exime os pais do grave dever de levar, quanto antes, os filhos à pia batismal, pois, se os sacramentos não obrigam a Deus, obrigam a nós, criaturas.
Texto extraído do cap. 5, pp. 25-29.
CATÓLICOS PERGUNTAM
Dom Estêvão Tavares Bettencourt (osb)
ed. Lumen Christi / O Mensageiro de Santo Antonio
Fonte:http://agnusdei.50webs.com/livr1.htm
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