ESTUDANTE DE D. (Rio) : “Alguns autores dividem os casos de anormalidade em naturais (homossexualismo ativo e passivo) e aberrantes (Iesbianismo). As pessoas que sofrem de aberração sexual são irresponsáveis e incuráveis, dizem; por isto devem ser sacrificadas como certos animais. Será mesmo assim? O anormal de fundo sexual é realmente inconvertível?”
A formulação do problema acima já por si merece reparos, pois pressupõe princípios discutíveis e insinua a precária solução por eles inspirada.
À luz da sã filosofia e, mais ainda, da ideologia cristã, não há anormalidade «natural» (em oposição a «aberrante»). O que decorre da estrutura da natureza, o que é natural, é em si bom e aceitável, pois a natureza tem um Autor Divino, Bom e Sábio. Segundo a classificação acima, o homossexualismo (entendido como união sexual de varão com varão), sendo natural, seria aceitável, tolerável; constituiria um hábito moralmente indiferente ou até justificado do ponto de vista moral (há quem chegue a dizer que os homossexuais representam uma espécie de intersexo da espécie humana). Só seria moralmente condenável o lesbianismo (união sexual de mulher com mulher); mas em tal caso não haveria responsabilidade moral...
Como se vê, estas teses decorrem de idéias materialistas, mecanicistas, as quais são contrárias à sã razão, por desconhecerem a personalidade e o aspecto espiritual do homem.
Elas sugerem as observações seguintes:
1. Toda anomalia sexual é uma aberração; é contrária à natureza e, por conseguinte, algo de indesejável, que em tese se deve procurar remover. Ora anormal e aberrante é qualquer tipo de união sexual entre indivíduos do mesmo sexo; vem a ser uma violação ou retorsão infligida à natureza, pois a fisiologia do sexo apresenta estrutura tal que naturalmente pede seu complemento na união com o outro sexo. Nada permite dizer que essa aberração no varão é menos culposa do que na mulher.
2. Também nada há que de antemão indique serem a homossexualidade e o lesbianismo males irremediáveis.
Este segundo ponto, porém, merece mais detida atenção.
Os médicos nos últimos decênios têm indagado assiduamente as causas das anormalidades sexuais. Alguns querem reduzir a homossexualidade e o lesbianismo a fatores orgânicos: desequilíbrio fisiológico hereditário, deficiente funcionamento de glândulas, etc. Acontece, porém, que nenhuma explicação biológica foi até hoje suficientemente comprovada, de modo a se tornar concludente. — Outros preferem explicar a homossexualidade em geral, recorrendo a agentes extrínsecos: influências da educação e do ambiente, as quais são particularmente poderosas na idade infantil; Freud, de um lado, com a tese de que todo indivíduo é originariamente bissexual, e os não freudianos, de outro lado, explicam por diversas vias o psiquismo que daria origem à homossexualidade.
Tudo considerado, parece que se deve admitir, para dar conta da anomalia, o concurso tanto de fatores inatos, hereditários, como de agentes educacionais e hábitos adquiridos pelo indivíduo. É, sim, evidente que toda criança recebe de seus pais uma natureza bem marcada por notas pessoais; a alma e o psiquismo desta criança sofrem naturalmente influência da constituição somática que lhes é dada por geração; se esta constituição é de certo modo doentia, as atividades da alma, o desenvolvimento de suas faculdades superiores serão entravados ou desviados para termos aberrantes. É importante, porém, notar que os defeitos fisiológicos herdados não são sempre tais que extinguem por completo o domínio da alma sobre o corpo. Isto se pode dar, sim; têm-se então indivíduos irresponsáveis, 100% tarados, os quais não constituem o caso mais frequente.
Em geral, os defeitos somáticos hereditários apenas diminuem o domínio da alma sobre o corpo. É claro que então a responsabilidade e a culpa de quem cede à aberração sexual são em grau maior ou menor atenuadas, não, porém, canceladas por completo. A diminuição de responsabilidade não implica que o indivíduo tenha «carta branca» para ceder a seus hábitos.
3. Como tratar uns e outros de tais indivíduos sexualmente anormais?
Os que, após o devido exame, são reconhecidos 100% tarados, isto é, incapacitados de usar da sua razão e da sua vontade livre por possuírem constituição somática deficiente, hão de ser isentados de culpa. Dado que a sua correção ou regeneração pareça impossível aos olhos dos médicos (questão que se deve estudar de caso em caso), nem por isto hão de ser entregues à morte como animais nocivos. O cristão sabe que cada individuo possui uma alma espiritual, cuja atividade nem sempre é patente aos que o vêm; embora não consiga comportar-se constantemente à altura de uma criatura humana, é bem possível que o homem anormal produza atos (externos ou meramente internos) em que sua inteligência e seu amor se exercem devidamente; é mediante estes atos lúcidos, «humanos», que cada individuo deve, por desígnio de Deus, configurar a sua sorte eterna. Por conseguinte, não será lícito a autoridade humana alguma abreviar o tempo de vida de uma pessoa anômala, por muito penosa que esta se torne para a sociedade. Esta a deve suportar (sequestrando-a, sim, do consórcio do próximo e das ocasiões de cometer o mal), enquanto Deus mesmo não a retira deste mundo, pois o homem se acha na terra não estritamente para ser útil à coletividade, mas para salvar a sua alma e assim dar glória a Deus na eternidade. Veja-se a respeito «Pergunte e Responderemos» 8/1957, qu. 10.
Acontece, porém, que a maioria dos indivíduos que sofrem de alguma anormalidade sexual, não entra no caso acima: é suscetível de tratamento médico e de cura.
Pode-se-lhes aplicar uma terapêutica ou física ou psíquica.
a) A terapêutica física supõe ser a anomalia proveniente de causas orgânicas; recorre, por exemplo, a injeções de testosterona e outros extratos endócrinos; o médico norte-americano Owensby, aplicando injeções de metrozol, conseguiu transformar seis indivíduos homossexuais em heterossexuais (cf. N. M. Owensby, Homosexuality and Lesbianism treated with Metrazol, em «Journal of Nervous and Mental Disease», vol. 92 [1942] 65-66). Também os eletrochoques deram bons resultados em pessoas homossexuais (cf. S. Liebmann, Homosexuality, Transvestism and Psychosis, ibd. vol. 99 [1944] 945-958).
Parece que ainda melhor êxito é obtido pela psicoterapia, a qual visa mudar não a constituição somática do doente, mas a sua atitude mental. A primeira medida a se tomar neste caso é a de convencer a pessoa homossexual de que ela deve sinceramente querer livrar-se da anomalia, pois, dizem os médicos, a maioria dos homossexuais não deseja curar-se; quando vão procurar o psiquiatra (o que não se dá com frequência), fazem-no muitas vezes por medo da policia, do escândalo, do ostracismo social, etc.; contudo, enquanto não se queiram sinceramente transformar, não há psiquiatra que lhes possa ser útil. É preciso outrossim desfazer no doente a persuasão, disseminada por uma literatura barata, de que a sua anormalidade lhe é inata, biológica e, por conseguinte, incoercível.
Os resultados da psicoterapia comprovam que a homossexualidade (fora casos mais ou menos excepcionais) não é incurável. Certos médicos conseguiram fazer do homossexual um heterossexual; foi o que declararam Ferenczi em 1914, J. Sadger em 1921, J. Vinson e S. Nacht em 1930, E. Frey em 1932, E. Carp e A. N. Foxe em 1941, Thomas V. Moore em 1945. Em outros casos os psiquiatras obtiveram que o paciente recuperasse o equilíbrio mental, sem se tornar por isto heterossexual; possuindo este equilíbrio, não há dúvida de que o paciento exerce mais facilmente o controle sobre si mesmo.
Por fim, faz-se mister sublinhar o valor insubstituível da religião ou, em linguagem cristã, do recurso à graça de Deus, para se obter a vitória sobre a paixão homossexual. O cristão sabe que Deus o chama a levar uma vida moralmente íntegra e lhe dá os meios para isto; crê, portanto, que não está condenado a viver ininterruptamente no pecado (as suas recaídas, desde que não sejam plenamente deliberadas nem voluntárias, são faltas menos graves). Do seu lado, o Senhor não pode deixar de prestar ouvidos benévolos a quem sinceramente Lhe peça a extirpação de seus vícios. Ademais o cumprimento dos deveres religiosos coloca a vida da pessoa homossexual num plano mais elevado, tornando-se para ela um dos melhores fatores de sublimação de sua tendência sexual.
Dom Estêvão Bettencourt (OSB)
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