sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Como se forma a espiritualidade de uma vocação?

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Comunidade Shalom

Vinte e cinco anos! Tempo de Jubileu. Tempo de grandes graças. Tempo de contemplar o que Deus fez apesar de nossa fraqueza. Tempo de colher. Tempo de podar, de preparar novas mudas e replantar. Tempo de louvar, louvar, louvar.

 Como se forma a espiritualidade de uma vocação? Ou, se você preferir: Como se revela a espiritualidade de um Carisma? É disso que trataremos brevemente.

A pessoa do fundador

Um primeiro e indispensável elemento é a pessoa do fundador: sua história de vida, sua forma de relacionar-se com Deus, com a Igreja, com a Palavra, com o homem, com os irmãos, com os pobres, com as contingências de sua vida, sua maneira própria de ver o mundo e de viver a fé, a esperança e a caridade.

Isso é feito ao longo de toda a sua vida. Antes mesmo de seu nascimento já se pode e deve encontrar na história de sua família elementos do que se chama de “espírito do fundador”. Deus, que é o autor do Carisma, providencia sinais que poderão ser lidos depois pelos discípulos do fundador como elementos importantes na formação da espiritualidade de sua vocação.

Na medida em que o fundador vai vivendo, o Carisma revela-se, como vimos, em sua história e visão de mundo. Isso, logicamente, de forma natural, espontânea, não programada. Ninguém nasce e cresce sabendo que vai fundar uma comunidade. Somente ao longo da vida – e, no nosso caso, depois que a Obra foi fundada, com a lanchonete – a pessoa vai percebendo que Deus lhe deu dois carismas essenciais para a fundação: o Carisma de Fundador (para fundar uma comunidade, instituto religioso, congregação, movimento, etc.) e o Carisma da Fundação (ou seja, o Carisma que caracterizará o que fundou: Carisma Franciscano, Carisma Carmelita, Carisma Vicentino, Carisma Shalom). O primeiro, é exclusivo do fundador. Ninguém a não ser ele tem o Carisma de Fundador[1]. O segundo, o Carisma da Fundação, é o carisma que o fundador fará despertar, por identificação, em todos os seus discípulos ou, se preferirmos uma linguagem mais técnica, o Carisma que o fundador transmitirá aos seus discípulos. Estes, desde toda a eternidade, foram eleitos por Deus para viver este determinado Carisma e o trazem como parte de sua identidade de filhos de Deus.

Ao longo da história de vida do fundador, vai-se delineando a espiritualidade de um Carisma a partir do que se chama de “espírito do fundador” que é, em resumo, a forma histórica como o fundador viveu e vive o Carisma da Fundação. O Carisma da Fundação passa pela pessoa do fundador, necessariamente, mas independe dele. A Espiritualidade da Fundação também passa pela pessoa do fundador, necessariamente, e também independe dele. Já o Espírito do Fundador, não somente “passa” pela pessoa do fundador, mas o acompanha durante toda a vida e depende essencialmente dele, pois é a forma como ele, e mais ninguém, o vive.

Enquanto vivo, viverá a Espiritualidade do Carisma de sua forma própria, isto é, revelando o Espírito do Fundador. Uma vez falecido o fundador e o co-fundador[2], a Espiritualidade do Carisma, ou da Fundação, estará, já estabelecida. Da mesma forma, o Espírito do Fundador. Este permanece na história, tradição e espiritualidade da fundação e deverá ser imitado e seguido por seus discípulos, mas, evidentemente, confinado ao tempo histórico do fundador. Caberá aos discípulos “cavar”, pesquisar, rezar, explicitar e vivenciar o Espírito do Fundador e a Espiritualidade da Fundação e conservá-los vivos através de uma adesão vivencial. No entanto, estes não serão mais modificados, sob pena de se mutilar o próprio Carisma, revelado enquanto o fundador e co-fundador estiverem em vida.

Os discípulos

A existência de discípulos é o “atestado de Deus” de que um Carisma é autêntico. Pela identificação com o fundador e o espírito do fundador, eles começam a aproximar-se dele e se unirem a ele em sua missão e vocação. Estes discípulos, ao longo da história de um Carisma, serão formados de acordo com a Espiritualidade do Carisma (ou da Fundação) e com o Espírito do Fundador, levando-os adiante, através da vivência, mesmo após o falecimento deste. Daí a necessidade absoluta de, no tempo certo, sem queimar etapas, deixar-se bem clara a identidade de um Carisma, sua espiritualidade e o espírito do fundador e de se formar os discípulos segundo esta identidade e espiritualidade. A própria vivência dos discípulos, ao longo da história de vida do fundador, vai confirmando e modulando esta espiritualidade sem, entretanto, em nenhuma hipótese, modificá-la.

As expressões

As expressões de uma espiritualidade são partes essenciais da mesma. Embora adaptável aos tempos e costumes em aspectos superficiais, há características de expressões da espiritualidade (no nosso caso, o louvor e nossa forma de louvar, para dar só um exemplo) que não poderão ser modificadas sem atingir profundamente a própria espiritualidade.

A Dimensão Cristológica e Evangélica

Ao longo da história do fundador, o Espírito o introduz no mistério de Cristo cumprindo uma ação iluminativa e conformativa ao mesmo tempo. A partir da compreensão de um determinado mistério e em torno a esse, articula-se, em uma síntese harmônica e completa, a visão de todo o mistério de Cristo e do seu Evangelho. Também em torno deste mistério, se harmonizam os elementos estruturais da vocação, o que dá a ela sua característica e identidade única.

A dimensão cristológica que o Espírito nos apresentou foi a de Jesus Cristo como nossa Paz, o Ressuscitado que passou pela Cruz e nos comunica a Sua Paz, em Jo 20,19ss. Tal mistério cristológico, embora vivido por todos os cristãos, é entendido e vivenciado pelos que possuem o Carisma Shalom de forma única, a partir da estrada nova percorrida pelo fundador.

Ter clareza quanto ao mistério cristológico de uma vocação é essencial para a identificação vocacional e adesão pessoal incondicional ao Carisma com a conseqüente e coerente vivência do mesmo.



A partir do próximo número, estaremos apresentando, ainda que brevissimamente, alguns aspectos da Espiritualidade Shalom. Estamos conscientes de que ela não está ainda totalmente definida, uma vez que, graças a Deus, nosso fundador está vivo. No entanto, em vistas do jubileu e do rápido crescimento e expansão da Comunidade e com o objetivo de partilhar nossa vivência com todos que o desejarem, nos aventuramos, conscientes de nossa imperfeição, a oferecer vislumbres do que até hoje nos tem dado o Senhor neste aspecto.



Maria Emmir Nogueira

Para aprofundar o assunto:

I Fondatori Uomini Dello Spirito,

Fabio Ciardi, ed. Città Nuova Editrice, 1982,

Roma, pp 387-391


[1] É um engano pensar que toda vocação precisa ter um co-fundador; engano, igualmente, pensar que este tem “uma porcentagem” do Carisma de Fundador. O Carisma de Fundador e Co-fundador são dois carismas complementares, porém diversos.


[2] Referimo-nos aqui ao co-fundador com relação ao carisma e não ao co-fundador histórico, como se denominam os irmãos que iniciaram com o fundador, mas não têm necessariamente o carisma de co-fundação.
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Comunidade Católica Shalom
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