segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Sorrir mesmo na noite-Madre Teresa


F. Lacoste
shalom

Logo que Madre Teresa deu início à sua Obra nas ruas de Calcutá, sua vida interior ganhou uma nova dimensão: ela não experimentava mais a união intensa e sensível com Jesus. Antes consolada pela presença sensível de Deus, passou a ter o sentimento de estar separada dele. Sofrendo esta privação, entretanto, seu desejo de Deus torna-se ainda maior. Encontra o Senhor na obscuridade profunda de uma aspiração fiel. Madre Teresa viveu o desafio do abandono a Deus numa confiança cega e sem limites.

A atitude de abandono devia ser impressa na resposta de Madre Teresa ao longo dos anos em que viveu esta dolorosa experiência: “Aceito tudo com alegria, até o fim da minha vida”. Entretanto, uma questão surge naturalmente em seu coração: “Peço que Ele retire tudo; que não fique nada em mim... Ignoro que o amor possa fazer sofrer tanto! É o sofrimento da perda. E agora o desejo de um sofrimento humano, mas causado pelo Divino”. Assim ela confirma que está pronta a aceitar a vontade de Deus: “Sei que quero de todo o meu coração o que Ele quer, como Ele quer e no tempo que Ele quer. Mas, Pai, esta solidão é dura demais. A única coisa que me resta é a profunda e forte convicção de que é a Sua obra”.

Com efeito, esta convicção profunda de que a obra era de Deus lhe permite avançar através da obscuridade persistente: “Estou ainda mais convencida de que não é minha obra. Não duvido que foi você que me chamou com uma força e um amor assim tão grandes. É você... Mesmo agora, é você”.

A fé pura 

Madre Teresa foi conhecida por sua fé sólida como uma rocha, sua esperança invencível e seu amor ardente. Era, entretanto, unida a Deus sem essa suavidade que todos, até mesmo suas irmãs, pensavam que ela tivesse.

Ao contrário, a ausência desta doçura a obrigava a avançar na fé. Seu pedido de que rezassem por ela dá todo um sentido à luz do seu sofrimento escondido. “Eu vos peço, rezem, especialmente por mim, para que eu não estrague a obra de Deus”.

A vida de Madre Teresa é um testemunho de fé pura. Ela vê a mão de Deus em tudo o que acontece em si e ao redor de si. Se considera como “um pequeno lápis nas Suas mãos”.

Desde quando sua Obra começou, a obscuridade tornou-se a “companheira de estrada” de Madre Teresa. Suas cartas escritas entre os anos de 1950 e 1960 expressam o sofrimento que ela sentia por permanecer sedenta de Deus. No início dos anos 60, ela começa a compreender com gratidão o que isto significava na sua vida e o papel da noite interior na sua missão ao lado dos mais pobres e em meio aos pobres.

Em algumas cartas entre os anos de 1970 e 1980, ela exprime a intensidade da sua sede de Jesus, sua dor de ver o sofrimento dos pobres e também sua gratidão por, mesmo na sua pequenez, poder também ser pobre como Jesus e, através da sua pobreza, levar as almas para Ele. Dois anos antes da sua morte declarou ter recebido um dom maravilhoso de Deus: poder oferecer a Ele o vazio que ela sentia. Madre Teresa permanece neste estado de fé “obscura” e de abandono total até a sua morte.

Para a sua glória 
Madre Teresa vê nesta prova uma oportunidade de tomar parte nos sofrimentos de Cristo, que toma sobre si os pecados da humanidade e se oferece, Ele mesmo, em sacrifício ao Pai pela redenção do mundo. Carregado das nossas iniqüidades, Ele grita do alto da cruz: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” (Mt 27,46).

“Na sua agonia e no seu amor pelo homem, Ele grita: “Tenho sede!” (Jo 19,28). Tomar parte na paixão de Cristo tomou uma forma concreta na vida de Madre Teresa na maneira como ela aceitou toda forma de sofrimento como dom de Deus e um meio de Lhe testemunhar seu amor. Com efeito, a generosidade de seu amor cresce em proporção à intensidade da prova. Em um momento de grande sofrimento interior, num total esquecimento de si, ela diz: 

“Logo que você me pediu para imprimir sua paixão no meu coração, dei-lhe minha resposta. Se é para a sua glória e isso pode fazê-lo ganhar almas, se o meu sofrimento sacia a sua sede, eis-me aqui, Senhor. Com alegria aceito tudo até o fim da minha vida. Eu quero sorrir diante da Sua face escondida, sempre”.



Identificar-se com os pobres 

Depois de permanecer mais de dez anos nesta noite espiritual, considerada por ela cada vez mais intensa e difícil de suportar, Madre Teresa recebeu um novo apoio. Com a ajuda de um irmão, o jesuíta J. Neuner, ela acabou compreendendo que aquela obscuridade era “o aspecto espiritual do seu apostolado”. Ela lhe escreve: “Cheguei a amar a obscuridade por crer que, no momento, ela participa um pouco da noite de Jesus e do seu sofrimento sobre a terra. Você me fez aprender a aceitá-la como sendo o lado espiritual da “sua missão”. Escreva-me”.

Pouco depois de ter recebido esta luz, Madre Teresa começa a partilhar com as suas irmãs. Em 1961, ela escreveu uma circular na qual as encorajava a aceitar suas provas e sofrimentos como parte essencial de sua vocação, unindo-as à obra redentora de Jesus. A autoridade de suas palavras provinha de sua experiência de vida. 

“Sem sofrimento, sua obra seria uma ação social, muito boa e útil, mas ela não seria a obra de Jesus Cristo, ela não seria co-redentora. Jesus quis nos ajudar a partilhar nossa vida, nossa solidão, nossa agonia, e nossa morte. Tudo isso Ele tomou sobre si e carregou na noite, a mais escura. E sendo um conosco, Ele nos salvou. Podemos fazer o mesmo. Toda desolação das pessoas pobres, não somente sua pobreza material, mas sua miséria espiritual, deve ser salva e nós temos nossa parte... Tomamos parte no sofrimento dos pobres, porque sendo um com eles é que podemos salvá-los, quer dizer, fazê-los conhecer a Deus e levá-los a Ele”.

É igualmente significativo que ela recebeu uma luz logo que entendeu que seu sofrimento interior lhe permitia tomar parte no sofrimento redentor de Cristo pela salvação das almas. Madre Teresa afirmava que a missão das Missionárias da Caridade, e por conseqüência sua missão também, era saciar a sede infinita de Jesus na cruz, por amor e pelas almas, operando a redenção e a santificação dos mais pobres entre os pobres. Visto sobre esse “dia”, a longa e dolorosa noite interior se reveste não somente de um novo significado, mas garante a razão de seu abandono total, na verdadeira alegria.



Apóstola da alegria 

Um dos maiores sinais da fé e do amor de Madre Teresa durante sua longa e dolorosa noite espiritual foi sua alegria profunda e constante. Com a simplicidade que lhe era própria, ela radiava alegria sobre os que estavam ao seu redor. Sua alegria não era uma questão de temperamento ou inclinação natural, mas era fruto da graça de Deus e do seu abandono a Ele. Isso exigia um esforço consciente e resoluto. E quanto mais difícil, mais radiante era o seu sorriso.

Madre Teresa era decidida em se tornar “uma apóstola da alegria” e a exalar o perfume da alegria de Cristo onde ela estivesse. Seu amor por Deus era tão grande, que ela não se contentava em somente aceitar a cruz, mas fazê-lo com alegria. “Eu vos peço: supliquem a Nossa Senhora que me dê o seu coração, para que eu possa com mais facilidade cumprir Seu desejo em mim. Quero sorrir para Jesus e, se possível, esconder o sofrimento e a noite da minha alma, mesmo para Ele”.

Ela decide então sorrir para Jesus cada vez que algo lhe acontece. “Eu lhe dou então um grande sorriso. Obrigada, meu Deus, e dai-me a graça de me despojar cada vez mais”.

Extraído de Feu et Lumière nº 221 Pp. 38-41.

Revista Shalom Maná - Ed. Shalom

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